quarta-feira, 29 de julho de 2015
Volubilidade dos Fenômenos*
"Desde esse dia, cada instante de minha vida adquiriu para mim o sabor de novidade de um dom absolutamente inefável. Assim vivi numa quase perpétua estupefação apaixonada. Alcançava muito depressa a embriaguez e comprazia-me em andar numa espécie de aturdimento.
Por certo quis beijar tudo o que encontrei de riso nos lábios; quis beber o que encontrei de sangue nas faces, de lágrimas nos olhos; e morder a polpa de todos os frutos que dos galhos se inclinaram para mim. Em cada albergue uma fome me saudava; diante de cada fonte uma sede me esperava - uma sede particular diante de cada uma - e almejara outras palavras para marcar meus outros desejos
de marcha, onde se abria uma estrada;
de repouso, onde me convidava a sombra;
de nado, à margem das águas profundas;
de amor ou de sono ao pé de cada leito.
Botei intrepidamente a mão em todas as coisas e acreditei ter direitos sobre cada objeto de meus desejos. (Demais, o que almejamos, Nathanael, não é tanto a posse, é o amor.) Que toda coisa se irise diante de mim! Que toda beleza se revista e se matize de meu amor."
(*) Texto de André Gide em "Os Frutos da Terra"
Imagem de Wolney Fernandes
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