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quinta-feira, 10 de julho de 2014

Rakushisha - Cabana dos caquis caídos


Rakushisha é um livro silencioso, de escrita discreta e desencadeada com uma delicadeza ímpar. Pena ser tão curto porque a vontade que fica quando se chega ao final é de conhecer ainda mais as vidas de Celina e Haruki.

Ele, um ilustrador que recebe a missão de desenhar a tradução do diário de Bashõ e resolve ir pro Japão em função desse trabalho. Ela, uma mulher que carrega uma dor em segredo e decide embarcar com Haruki para o outro lado do mundo depois de conhecê-lo no metrô do Rio de Janeiro.

Desconhecidos, os dois partem juntos para essa viagem, mas empreendem, cada um a seu modo, viagens interiores. Os deslocamentos seguem duas ordens, uma externa e ourtra interna.

"Eu me pergunto se a vida por acaso se faz de reencontros. Talvez se faça muito mais de tangentes, de movimentos periféricos, de olhares fugidios que no instante seguinte já se dissiparam. Por que fincar os pés, então? Por que não somente viajar?"

O livro se interpôs em meu caminho quando, ao abri-lo no dia 17 de junho percebi que a narrativa começava exatamente nessa mesma data. Estava mergulhado em outras leituras, mas diante dessa coincidência, o livro parecia pedir para ser lido.

Dona de uma escrita leve (nem por isso, banal), Adriana Lisboa parece sussurrar a história pelas páginas e nas idas e vindas empreendidas pelos dois protagonistas nos vemos envolvidos com a trama desejando mergulhar cada vez mais fundo nas motivações de cada um deles para fazer a viagem descrita no livro.

"A viagem sempre é pela viagem em si. É para ter a estrada outra vez debaixo dos pés. Há sempre um 'e se' em algum lugar"

O segredo de Celina, embora previsível já nos primeiros capítulos do livros, acaba por nos conduzir a um amontoado de dores e memórias carregadas por mágoas passadas que por sua vez são entrelaçadas a amores perfeitos e desfeitos. Parece piegas no tema, mas na forma a autora consegue fugir das armadilhas criadas por esse tipo de abordagem temática.

Entremeado por trechos do diário e belos haikais do poeta Matsuo Bashõ, Rakushisha tem a serenidade e o ritmo que se estabelece numa outra ordem diferente das acelerações típicas do ocidente e permeado por uma filosofia que se aproxima daquela pregada pelo oriente.

"Lua na alvorada:
Será que o mensageiro regular
vem vindo pela estrada?"


Belo como todo haikai deve ser, recomendo para aquelas pessoas que gostam de viagens interiores empreendidas sob olhares deslocados, estrangeiros... renovados!

E para quem, como eu ficou curioso para saber o significado do título, lá vai: Rakushisha significa "Cabana dos Caquis Caídos".

Lindo né? E você ainda não viu nada!
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Livro: Rakushisha [4/5]
Autora: Adriana Lisboa
Editora: Alfaguara

Foto: Wolney Fernandes

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